Sunday, September 30, 2007

BLUE BUTTERFLY

Agostinho da Silva disse-me um dia que a solidariedade era uma forma moderna de expressão de egoísmo. Ajudamos o outro pela satisfação que isso nos trás e não necessariamente pelo impacto causado na vida do outro.

Quanto do amor é feito de egoísmo?
Quando do amor é feito do que nos causa conforto?
Balzac, o nosso malamute, morreu ontem depois de meses sem ninguem ter coragem de o mandar abater. E mesmo na última noite e na última manhã, quando ele gemia e se contorcia com dôr, não havia coragem para fazer o telefonema.

Ajudá-lo a morrer seria poupar-lhe sofrimento. Mantê-lo vivo, era dar-lhe a dignidade de o deixar partir quando a hora dele realmente chegasse.

Mas seria isso mesmo? Ou não teremos inconscientemente considerado que seria maior o nosso sofrimento ao ter que lidar com a morte dele? Ou não quisemos nós inconscientemente poupar-nos à responsabilidade de terminar uma vida e à dôr que vem daí. Ou não quisemos nós pensar que aquilo poderia passar e ele qual lázaro levantar-se dos mortos. Fomos cobardes ou amávamo-lo demasiado?

Poupar o sofrimento é um gesto de amor? Manter o que amamos o maior tempo possivel junto de nós é um gesto de amor dirigido ao outro ou a nós próprios?

Friday, September 28, 2007

NESTING

O mais difícil quando se regressa a “casa” é a perda de um espaço próprio.
Com a perda de um espaço próprio vem a perda da expressão da identidade. E daí surge uma tristeza que pode assumir nomes de teor mais científico.
Porque um espaço revela cada pedaço do que nós somos, e relembra-nos isso mesmo. A casa a que aprendemos a chamar casa deixa de o ser quando crescemos e saímos dela e passa a ser a casa deles, onde eventualmente ainda restará um quarto intacto ou não, com memórias boas ou más conforme a capacidade que cada um teve para lidar com a adolescência.

Lembro-me de cada detalhe das (minhas) casas onde vivi. Da forma como a luz incidia nesta ou naquela janela. De qual o canto ou a cadeira que escolhia para ler, ou para beber, ou para conversar, ou para usar o telefone.

De que cor eram as chávenas que usava para o chá, qual era o prato que normalmente fazia quando recebia amigos. Que flores tinha nos vasos ou no jardim. Que animal adormecia enroscado no meu colo ou nos meus pés. Quais eram os cheiros.
A de Alfama cheirava-me a canela e xixi de cão ainda a ser treinado. A da Alameda a blueberry e torradas. A de Moçambique a côco acabado de ralar e cera do chão amarela com lustro puxado à mão. A de Dili ao sândalo entremeado nas cortinas. A de Baucau a maçãs…
E em todas elas havia uma coisa em comum. A sensação de bem-estar que me invadia ao entrar, independentemente do nível de pó ou louça suja acumulada. E sinto que não consigo viver sem isso

Sunday, September 23, 2007

DEPOIS DE MILHÕES DE ANOS DE EVOLUÇÃO... WORTEN!!!

O spot é animado!
Uma sequência de jovens sorridentes de polo da empresa.
WORTEN.
A ideia é mostrar que todos os colaboradores (agora já não há empregados) possuem uma capacidade que os torna incriveis e fundamentais no perfeito funcionamento da empresa.
O Pedro é super rápido.
O Rui tem uma memória incrivel.
O Diogo sabe tudo de música (acho que estou a trocar os nomes todos!)
O não sei quantos de tv.
Também há meninas.
Uma é super simpática.
A outra super arrumada...

public.relations@modelocontinente.pt acho que vou ter que lhes dizer onde eles poderiam enfiar o spot. Naquele outro spot, claro! Querem ajudar-me?

Tuesday, September 18, 2007

MISS CAPULANA


Thursday, September 13, 2007

IF ONLY

Sempre me espantou a capacidade do ser humano para magoar.
Sempre me espantou a criatividade do ser humano para magoar e o prazer estranho que retira disso.

Mas o que mais me espanta ainda é a capacidade que o ser humano possui para o fazer com indiferença, fazendo doer com total leviandade; por não medir o impacto das palavras ou temas na pessoa que os recebe.
E maior do que a dor que se sente quando nos magoam de uma forma programada, é a dor que se sente quando nos magoam com indiferença. Quando não há lugar para um sentido protector, quando não se sente necessidade de colocar algodão debaixo dos nossos pés. Ou então de não colocar lá mais nada, mas deixar-nos seguir a nossa marcha com a paz dos que querem estar na vida em tranquilidade.

Apenas isso. Tranquilidade.

Wednesday, September 12, 2007

PRIORIDADES...


Há uns anos atrás Portugal, solidário com Timor, indignou-se com João Paulo II que ao aterrar em Dili, vindo da Indonésia, não beijou o solo Timorense, reconhecendo implicitamente a autoridade de um país sobre o outro.


Hoje chegou o Dalai Lama.
Sem honras.


Todos os dias chegam novos produtos chineses ao mercado português.
Prioridades...

Tuesday, September 11, 2007

SETEMBRO, 11

Há 6 anos, antes de sair de casa ali entre a Alameda e o Areeiro, vi um avião a embater numa das Torres e achei triste dramático e irreal, desliguei a TV, peguei nas malas e fui para o aeroporto apanhar o avião para Londres e depois para Sidney e depois para Darwin e depois para Dili. Era na altura uma viagem em direcção à recuperação da sanidade, sem nunca sonhar ou imaginar o fim que iria ter - muito feliz, poderia dizer agora! Fiquei quase 3h dentro do avião sem perceber muito bem o impacto das imagens que deixei no monitor da tv, lá em casa, onde tinha ficado também uma outra vida para trás sem que eu tivesse noção disso ou mesmo oportunidade de me despedir dela. 1,5h depois um Russo alcoolizado é retirado do lugar atrás do meu e arrastado até à porta do avião por dois policias enquanto com voz enrolada ía dizendo"yeah I'm a terrorist,I´m a fucking terrorist". E houve gente que desistiu e saiu. E eu pensei fazer o mesmo porque há num limite para os amendoins salgados que se podem comer enquanto se espera. Mas o piloto convenceu-me a ficar.
E lá se foi para Londres.
Londres era o caos. Com todos os vôos atrasados e todas as bagagens, sacos, saquinhos saquetas a serem revistados. Lembro-me do Paquistanês de turbante na cabeça que me revistou o saquinho com aquelas coisas que as meninas usam em dias especiais do mês e de eu lhe dizer que pronto, aquilo era um bocado embaroçoso e ele reponder que não poderia ser mais do que para ele e senti-o ruborizado por trás das barbas. Mais tarde vi-o a conduzir o autocarro que nos levou ao avião. Acho que toda a gente naquele aeroporto fez um pouco de tudo naquele dia.

E lá se foi para Sidney. Mais de 5 horas de atraso.
E em Sidney as ligações perdidas e as malas também. Recebe-se um estojozinho com um penso higiénico, 3 toucas de banho, uma escova de dentes, uns calções e uma tshirt brancas da Quantas e $100 dolares australianos que na realidade parecem dinheiro de brincar porque têm pássaros e cores e zonas transparentes. E porque não querem mais despesas para compensar vôos perdidos, enfiam-nos em aviões em passo de corrida e subitamente vejo-me a caminho de um destino que não era o meu com um jornal debaixo do braço, onde ha fotos de corpos mutilados e edificios destruidos e sentada no chão em Alice Springs, com um aborigene descalço a caminhar à minha frente - que eu penso que é pago para dar um ar exótico ás instalações - descubro que o mundo mudou enquanto eu voava em classe turistica.

Foram quase duas semanas, se não me engano, em que eu e mais duas pessoas, vestimos diariamente todos os dias - como se diz na RTP, os calções brancos e a tshirt da Quantas, fazendo-nos parecer membros de uma seita desportista. Depois chegaram as malas e toda a minha roupa tingiu por causa da humidade. A T-shirt perdura e livrei-me dela simbolicamente antes de vir de Timor em Julho.
O terror também perdura. E depois de Bali, e de Madrid e de Londres, sabemos que estamos frageis e expostos em qualquer local do mundo. Mas dessa noção de fragilidade tem que nascer qualquer coisa. Mas a única coisa que nasceu foi um desejo supostamente justificado de manipulação, ingerência e total desrespeito por direitos básicos.
E isto é muito mais incómodo do que viajar em turistica enquanto o mundo muda.


TAMBÉM TU, BRUTUS?!

A menina do lado sou eu, com a idade da minha filha.
Acho que o cabelo deve ter sido seco pelo meu pai, acho que era sempre ele que o fazia e punha-me aquele ganchinho de lado. O vestido era de um tecido cru e com o tempo começou a apertar-me na barriga e a limitar-me o movimento dos braços, mas eu gostava muito dele e tenho-lhe memórias de festas associadas. Acho que toda a gente tem um vestido assim; daqueles que se toca no tecido e se sentem coisas boas apesar de as não recordarmos com detalhe.
A foto é de um casamento, claro. Só nessas fotos se fica assim hirto a olhar para a frente meio-assustada. E recordo-me que era de uma amiga da minha mãe, também professora, que não era daqui. Era a única crescida que eu conhecia que tinha um namorado e eu achava que ele era também meu namorado porque supunha eu que as pessoas tinham cada uma apenas uma função. E no dia do casamento, seguindo, se não me engano, uma tradição da terra, eles caminharam pelas ruas com o cortejo atrás e eu fui assim à frente de mão dada com eles, estragando-lhe todas as fotos, mas achando que, pronto, ele deveria caminhar com as duas namoradas.
Ela era muito bonita e usava o garfo de uma maneira especial como se tivesse que rir sempre antes de cada garfada.
Hoje tropecei na foto. Tropecei literalmente na foto, porque estava no chão na confusão a que eu chamo quarto. E olhei para a foto da menina que eu fui e que tem a idade da minha filha e pensei no que diria ela de mim se me conhecesse, com o meu garfo na mão, com o meu vestido de casamento, a rir-me à mesa. E achei que ela não iria olhar para cima com os olhos castanhos achinesados e desejar ser como eu quando fosse crescida. E sinto que a desapontei. Dei-lhe excesso de peso e hipertensão, uma franja que não queria e o cabelo pintado de preto por engano. Dei-lhe o Elia Kazan como realizador preferido e lágrimas a ver o Esplendor na Relva, de cada vez, como se fosse a primeira. Dei-lhe 5 anos de ensino superior para nada, um mestrado inacabado, doenças tropicais. Dei-lhe um gosto por causas perdidas e o horror à confrontação. Não lhe dei casa própria, nem carro próprio e ás vezes nem amor próprio e sinto-me culpada por isso. Dei-lhe um gosto pelo sarcasmo e pela ironia e disso não me arrependo porque esse é o truque de passar pela vida, conhecendo-a e aceitando-a sem a aceitar. Dei-lhe o gosto pela comida condimentada com especiarias, colorida com especiarias e perfumada com especiarias. E o vício do chá e das pilhas de livros. E mais nada.

O que não deixa de ser mau, porque a menina da foto ao lado queria ser cabeleireira...