Sunday, December 24, 2006

PORQUE É NATAL...

aos amigos felizes que dividiram os dias felizes connosco
aos amigos tristes que dividiram os dias tristes connosco

aos meninos e meninas que se reunem à noite debaixo da nossa janela para ouvir as historias que conto à G.
e que voltam para casa e adormecem sobre a esteira sem beijos

a vocês que passam por aqui e partilham os nossos dias

e a vocês que passam por aqui e partilham os nossos dias e a quem sentimos como amigos sem nunca vos termos visto

a vocês e a vocês e a vocês, FELIZ NATAL!

Thursday, December 21, 2006

THE BONESETTERS

Não resisti. Foi mais forte do que eu e fui espreitar para saber se o País ainda existe. Descobri que continuam a fazer cáca. Digo cáca porque não sou pessoa para dizer merda. Acho falta de educação. Dizer que continuam a fazer merda em Dili seria rude da minha parte e deixaria a minha mãe embaraçada. A minha mãe é uma pessoa que lê este Blog,e, como é facil de perceber, isso não me ajuda a ser mais criativa.
Portanto Dili continua uma cáca.
E a cáca desta vez aconteceu na zona da mesquita. E as pessoas da vizinhança (católicas), correram e refugiaram-se lá. Na mesquita. A mesquita é um local onde por norma há muitos Muçulmanos. Os Muçulmanos não são católicos. Claro! No pátio da Mesquita vivem agora - como em Maio - mais de 400 Católicos, protegidos por Muçulmanos num país de Católicos.

Isto para mim é Natal.

Monday, December 18, 2006

STRIPPED BARE

A opção foi não activar o telemovel e estar assim em isolamento.
E sabe bem.
Há muito tempo que não tinha férias. Férias daquelas que se sabe quando começam, quando acabam, sem consultar agências noticiosas para saber se o país ainda existe.
neste momento o país pode deixar de existir
podem assaltar-me a casa e levar tudo
os funcionários podem demitir-se em bloco no escritório
levar os computadores com eles
a amélia pode fazer toda a limpeza da casa com o mesmo pano
o porco do vizinho pode dormir à entrada da nossa porta
o gato do senhorio e devidas pulgas fazer sonecas no sofá da varanda
o peixe pode subir de preço
o ministro pode fazer despachos em inglês
a chuva pode arrastar tudo atrás de si
porque eu estou aqui e estou de férias e tenho chá de gengibre e não vou consultar agências noticiosas para saber se o país ainda existe

Saturday, December 16, 2006

ALMOST DONE!

GETTING THERE


dia 12:baucau-laleia, vemasse, manatuto, metinaro, hera,
areia branca, dili, bali, kuta, sanur,dempasar,
bangkok,madrid,lisboa:dia 14

Wednesday, December 06, 2006

ST NICHOLAS

Em reunião no escritório, digo a 11 adultos com idades entre os 30 e os 45: "Hoje é noite de S. Nicolau". E explico as tradições da Europa de Norte, a bota, a meia, o sapato, as bolachinhas, o bom comportamento... e remato com:"Certo não seria má ideia deixarem aí a bota. Pode ser que tenham sorte. Pareceu-me vê-lo perto do mercado, é capaz de passar por aqui" disse eu aos 11 adultos com idades entre os 30 e os 45 anos.
Alguns dos adultos com idades compreendidas entre os 30 e os 45 anos respondem: "Mas a gente não tem botas, só chinelas e sandálias" e vão levantando o pé um a um criando um efeito de can-can. Ao que eu replico: "Então certo a solução é fazer umas. Tá ali aquela pilha de papel usado. O melhor é mesmo fazer umas, não?" E começo a fazer a minha e penduro-a na janela com fita-cola.E vou para casa. Duas horas depois acho melhor voltar ao escritório e ver se aconteceu alguma coisa, não vão haver desilusões no dia seguinte. E quando entro nem quero acreditar. 11 botas das mais variadas formas (também há sapatos) foram construidas em papel e decoradas com toda a espécie de elementos (flores, franjas de papel... aguarela). E não tive outra opção senão correr de volta a casa e explorar gavetas e verificar uma a uma cada loja de Baucau e encher as botinhas de doces, bolinhos, chocolates, pastilhas elásticas e colares e carteirinhas para as meninas, reforçando os cantos com agrafos de forma ao papel não ceder.
Tenho pena de não ter visto a reacção pela manhã.
Poderia ter visto. Poderia ter passado pelo escritório antes de vir para Dili, mas achei que aquele momento não era meu. Era o momento de 11 adultos de idades compreendidas entre os 30 e os 45 anos receberem um mimo como crianças e poderem comportar-se como tal livres da obrigatoriedade do obrigado e do comportamento de crescido. Mas não consigo evitar um sorriso quando penso na cara deles ao chegarem pela manhã...Bolas! Gostava mesmo de ter visto!

Tuesday, December 05, 2006

SÃO ROSAS, SENHOR, SÃO ROSAS

A equipa chega assustada de Natarbora. Parece que estamos na altura do ano em que algumas famílias da zona de Viqueque vão em segredo até à zona de Natarbora e fazem lulik.
Lulik é o termo que se usa para tudo o que é sagrado. Todo o acto ligado ao sagrado é chamado de tradição. Fazer tradição significa levar a cabo um acto de louvor ou celebração do sagrado; anímico.
Num Português difícil, porque o Português aqui no escritório torna-se sempre difícil quando se relata algo que faz parte da realidade mas ao qual as pessoas não querem ser associadas, é-me contado o que se passou. Determinadas famílias de uma aldeia na zona de Viqueque estão a fazer o que fazem todos os anos. Estão a fazer a tradição e viajam pela calada até à zona de Natarbora e matam e roubam. E quando matam tiram o coração e a língua e dão-os a comer a uma cobra específica. O coração e a língua de gente, não de animais. Diz-me a J. que quando souberam correram a ver a lista de professores presentes e morreram de medo quando verificaram que a aldeia da dita zona enviou os seus professores…As noites foram por isso mal passadas… E a conversa decorre e salta-se de história em história durante o almoço. E com horror descubro os detalhes das tradições canibais ainda presentes, a menos de 50km da mesa do Amália onde estamos a comer.
Parece que há uma semana a A. se cruzou com uma mulher que estava em fuga. Tinha deixado o marido e não ía voltar. Tinha sido mãe há pouco tempo e depois de algumas horas a lavar roupa, ao chegar a casa viu uma panela ao lume, ao destapá-la viu a mão do seu bebé. A família do marido fez tradição; todo o primeiro filho tem que ser morto e comido. A mais alguns km desse local, por tradição, os corpos não são enterrados. São comidos pelos familiares. E se alguém mais afoito faz um enterro, o corpo será desenterrado e a tradição será feita. “É preciso cuidado com o homem com quem se casa. Nós não sabemos se ainda são antigos e fazem a tradição. Não é todo o Timor, é só assim nalguns sítios.” E as descrições prosseguem cada uma mais complexa do que a outra, horror atrás de horror que revelam o quanto de tribal Timor ainda tem, e a insanidade dos políticos e da comunidade internacional que trabalha nesta terra, ao não o reconhecer não adaptando por isso os seus métodos e estratégias a esta realidade.