O SENHORIO MANDA DIZER....(PARTE 3)

...que dentro de 2 semanas poderei mudar-me para a casa!

os milagres do pavão...

acho que vou sentir falta desta vivência comunitária do compound dos Maristas.
os australianos são velhos resingões e exaustos e eu acho isso simplesmente encantador!!!!
as questões da higiene da comida, da lavagem dos pratos da selecção do menu (galinha e arroz a todas as refeições) causam dramas diarios terriveis que me deliciam porque sei que estou aqui de passagem... e adoro os fins de tarde com os brasileiros a comer mingau e discutir linguistica!

e dentro de duas semanas tenho a minha casa! e acabam-se as corridas a dili para comprar torneiras dentro do orçamento... e surgem novas preocupações: como é que vou tirar os 3 rapazes que tocam viola em cima do meu telhado todas as tardes? como é que convenço metade da vizinhança que a minha varanda não é um miradouro?como é que explico aos vizinhos que NÃO ACHO SIMPÀTICO que me sigam dentro de casa de divisão em divisão como durante a ultima visita...
e onde é que vou arranjar um inversor para manter o frigorifico a funcionar com uma bateria de automovel???? ONDE? ONDE???

O SENHORIO MANDA DIZER....(PARTE 2)

... que os azulejos que comprei para as janelas da casa de banho são: "permita-me que lhe diga à minha senhora que nunca vi coisa tão linda!".
são uns pavões em branco com uma cauda compridíssima que vão servir de janela porque têm assim uns cortes em relevo - coisa fina- que deixam entrar o ar e só custam 5.5 dolares cada um! É uma coisa divinamente horrorosa que encontrei numa loja em Dili e logo que lhe coloquei a vista pensei: "é isto!, agora é que o homem me vai instalar o tanque de água de graça".
No mesmo tom sério respondi: "E saiba o Sr. Jacob que o pavão é bicho que atrai muita sorte!" "Não me diga a minha senhora" "É verdade Sr. Jacob!" "Pois é disso que precisamos, digo à minha senhora. Eu, a minha senhora e esta nação que precisamos de fazer caminhar para a frente"

Bolas! Chegou-se-me a própria da culpa!

Nem lhe falei no depósito de água...

E NO DOMINGO PASSADO...

matámos um porco!!!
e cortámo-lo e cozinhámo-lo e comêmo-lo sofregamente antes que alguma mosca lhe tocásse.
e os pedaços eram grossos, tortos, mal cortados porque ninguem percebia do assunto e por aqui corta-se tudo muito fino muito fino e nada de lombo ou febras ou o raio... mas nós queriamos era carne!!!!
e hoje, uma semana depois... continuamos a comer o mesmo bicho...
e o frigorifico não teve qualquer intervenção em momento algum desta história.... apesar de existirem 3 na cozinha...

COISAS QUE FAZEM RIR...

E do outro lado da janela cresce forte sereno e frondoso um belo pe daquelas ervas que fazem rir rir rir...

O MEU SENHORIO MANDA DIZER...

que a obra na casa de banho esta parada.
devo comprar outros azulejos para a parede.
estes que trouxe nao sao bonitos...!!!!

Oh Valha-me Deus!

AU BA TOBA, SENHORA...

a equipa não está habituada a ser gerida
a casa não tem pratos não tem colheres não tem tachos
na casa de banho chove
ha água duas vezes por semana
luz das 6pm à meia noite
no mercado mal se distingue a carne de bufalo sob as moscas pretas e gordas de consolo
a internet não se move e os virus saltam vivos e contentes no monitor à minha frente
desço a dili
a meio do caminho o motorista pára e acende um cigarro. não tenho coragem de lhe dizer que não suporto o fumo em ambientes fechados. é um homem bom e delicado com os dentes marcados a preto pelas cáries.
ele debruça-se na janela dá duas passas no cigarro e atira-o. ao lado do carro está um pequeno marco em cimento cuidadosamente pintado a branco e com um nome
assinala o local onde o único irmão morreu num acidente. aparentemente o ritual do cigarro repete-se a cada passagem pelo local
atravessamos a ponte
"aqui morreram 10 crianças" diz ele. Acidente? pergunto. "não, tradição. para fazer a ponte forte". A G. desperta e não pergunto mais detalhes. "Todas as pontes de Timor têm sangue de criança" adianta.
fixo um ponto no exterior
não falo
e penso
quero saber mais?
preciso de saber mais?
sinto que cheguei há muito tempo.
herdei subitamente o cansaço de há 3 anos.
O que quero eu daqui afinal?

a G. foi pela primeira vez à escola. tem uniforme. 2. cada um para uma situação especifica.
tem uma professora magrinha de véu a quem tem que chamar Madre.
ofereceram-lhe um terço em contas coloridas de plástico.
inocentemente tentou enfiá-lo pela cabeça julgando ser um colar
delicadas, ofereceram-lhe um cantil em forma de bota e ela feliz chega a casa e grita: "mamã, bebo água por um sapato!"
e eu só penso: não é fervida...
coça a cabeça... assusto-me.

em dili procuro azulejos, sanitas e sinto-me "mulher" outra vez; as compras! O consolo! Não são livros, não são sapatos. são carros todo o terreno, autoclismos... Não interessa! Porque dá sempre para perguntar: " e tem este modelo numa côr diferente?"
e por momentos... por breves momentos...

SINFONIAS...

4 da madrugada a mikrolete para ao lado da minha cama e ouve-se Dilililililili...

de 15 em 15 minutos 50 galos confusos cantam um cocoroco rachado e muito muito fora de tom

o maldito do lagarto aproveita os intervalos e grita toooooooooo-ke toooooo-ke

2500 formigas minimas, descobriram o meu lap top e exploram-no em todos os seus cantos recantos e orificios. Brotam dele biblicamente...